Imaginem uma leitura que arrebata você. Que faz você se questionar mais e mais a cada capítulo, que faz você questionar todos os significados que já distribuiu por aí. Que faz você pensar em quantas vezes tentamos e fracassamos, e se estamos certos em nos crucificar por isso (ou, pior ainda, aos outros).
A Árvore das Lágrimas traz um enredo voltado para o perdão, abalo familiar, e reconstrução da vida.
Irene tinha a família perfeita, os filhos perfeitos, e seguia a tradição que a família criou naquela cidade de interior há anos: Morava na mesma casa em que nasceu, mantinha a mesma rotina que a mãe, a avó, a bisavó… E era amiga das mesmas pessoas com que cresceu.
Isso, até seu marido, Nate, receber uma proposta de trabalho numa outra cidade, e decidir que essa mudança faria bem a eles. E, mesmo com um péssimo pressentimento quanto a isso, ela e seus dois filhos, Bliss e Shep, o seguem.
Algum tempo depois, quando suas vidas já estavam construídas e até mesmo estáveis nesse novo cenário, Oregon, Shep é morto num aparente assalto à casa, fazendo com que Irene caia em depressão, Bliss vá morar com os tios e Nate carregue um fardo que se apresenta em forma de pesadelo todas as noites.
É iniciada uma corrida atrás do bandido, que praticamente se entrega à polícia, e ao longo dos anos vemos esse caso evoluir. E Irene se sufocar em ódio e amargura.
Se for assim, talvez quando meu irmão morreu essas células que compartilhávamos também tenham morrido. E, no nosso caso, eram células do coração. As paredes finas e frágeis que nos permitem abraçar a vida com destemor e fé. Sofremos porque nosso coração está morto, uma célula de cada vez.
Um dos pontos que me fez agarrar esse livro com todas as minhas forças foi o modo como a autora descrevia a situação, os sentimentos, a aflição de uma mãe. Não era algo mal desenvolvido, que acabava repetindo várias e várias vezes a mesma coisa, mas sim uma narrativa que demonstra o que levou a pessoa a pensar em tal ponto, a considerar tal hipótese, a sofrer. Retrata com realidade e fidelidade as fases de uma depressão, e mesmo que a escrita seja direta, acaba nos tocando.
No aniversário de 27 anos de Shep, 12 anos após a morte do filho, Irene aceita a verdade: Não pode viver em função disso. Mas sua filha foi embora, está cursando faculdade num local distante, e havia deixado bem claro o quão patética ela era por se concentrar tanto nessa dor; e seu marido parecia não se importar com nada: o filho, o casamento, ela mesma… Nada. E essa união de fatores faz com que ela pense em suicídio, e também em perdão.
Há longos caminhos a trilhar, ela pensou. A morte de um filho, o ódio que surge, a dor infinita e imensurável. Há a família, as crianças, as mágoas e injustiças. Há corredores que duram para sempre.
E há também uma árvore, um passarinho e uma lembrança da beleza.
É quando começa a trocar cartas com Daniel, o homem que matou seu filho. Quando escreve a ele dizendo que o perdoa pelo erro terrível que cometeu, e acaba, dias depois, recebendo uma resposta. Aos poucos, acaba apoiando-se nele, até mesmo pela incredulidade em ver que não se parecia nada com um assassino: mas sim com um homem que cometeu um erro. Um erro terrível, que havia o matado também.
As cartas não se tornam o foco, apesar de tudo, mas sim o que acrescentava aos correspondentes, e as pessoas ao seu redor, como o superintendente Mason, que tinha que lê-las antes de repassá-las a Daniel. Com o tempo, aprendemos que todos temos uma história, e ela nos guia ao caminho que seguiremos.
Com o desenrolar, percebemos que a família, em si, é repleta de segredos. Mas uma coisa é certa: Nada fica encoberto, principalmente quando está tão claro que a morte de Shep está longe de ser esclarecida (e todos sabemos como uma mãe luta com unhas e dentes por isso!).
Há certas coisas que uma pessoa não devia ver na vida. Uma árvore chorando ao lado da sepultura do seu filho era uma delas.
Aquela era uma delas.
A história é complexa, repleta de voltas e mais voltas. Ela nos mostra quão longe um humano pode ir para proteger a si e à sua família, e também o quão deixamos as oportunidades passarem. Ambientada na década de 80, nos remete bastante ao poder que a religião tinha na época, crucificando qualquer um que saísse do seu ideal, e de como, pouco a pouco, começaram a se rebelar contra isso.
Vemos uma mulher questionar sua existência, sua história, seus ideais. A acompanhamos na jornada até o inferno, e sua volta. Vemos chegar ao seu pior, e ao seu melhor. Vemos a história se desenrolar como um novelo de lã, e também aprendemos que, a perda de um amor é a pior coisa que se pode acontecer. E também o quanto isso une as pessoas.
Então, uma coisa que peço antes que leiam esse livro (porque, acreditem, vocês devem fazê-lo), é para que não se apeguem aos ideais. Não é uma história sobre condenação, sobre uma guerra por vingança, sobre nada. É uma história que nos remete a tudo aquilo que não acreditamos, porém que está presente no dia-a-dia, em pequenas partículas do ar e dos mínimos gestos.
Tudo que ele sabia era que se tratava de uma coisinha de nada, e que, no final das contas, talvez apenas as coisinhas de nada importassem. Uma mão estendida. Uma carta. Um passarinho onde não devia haver passarinhos.
Título Original: The Crying Tree
Título Brasileiro: A Árvore das Lágrimas
Autor(a): Naseem Rakha
Editora: Suma das Letras
Ano: 2011
Páginas: 352
Sinopse: Irene e Nate Stanley viviam bem com os filhos Bliss e Shep na fazenda da família até Nate anunciar que recebeu uma proposta de trabalho irrecusável em outro estado. Irene reage mal à notícia. Parece pressentir que algo de ruim vai acontecer. Quando a família começa a se ambientar ao novo lar e finalmente digerir a mudança, os temores de Irene se concretizam: Shep, aos 15 anos, é morto a tiros num aparente assalto à casa da família. O assassino, Daniel Robbin, um jovem mecânico com extensa ficha criminal, é capturado e recebe a pena de morte. Muito tempo depois, Irene ainda não conseguiu superar a perda do filho. Seus anos seguintes resumem-se na ansiosa espera pela execução de Daniel. A angústia e o desespero que sente são tamanhos que Irene cogita buscar contato com o assassino, trocar cartas com ele e tentar entender seus motivos. Tentar perdoá-lo e, assim, quem sabe colocar um ponto final em toda a dor. Uma decisão difícil de explicar à família e que, por isso mesmo, ela esconde pelo maior tempo possível. Quando a data da execução se aproxima, as emoções de todos estão à flor da pele. Os Stanley ficam frente a frente com as feridas do passado e Irene vê que não é a única a guardar segredos. Todos ali carregam feridas pessoais e que só podem ser superadas se estiverem dispostos a lidar com a tolerância e o perdão. “Não escrevi o livro para fazer um panfleto sobre a pena de morte. Intelectualmente eu sou contra essa medida, mas confesso que não sei se minhas objeções resistiriam à vontade de vingança num caso como esses. Minha real intenção era fazer as pessoas confrontarem a questão do perdão. Como é perdoar, o que é preciso e o que isso pode nos trazer?”, questiona a autora.